Eu queixo-me muito. Queixo-me que está frio, que está calor, que é noite, que é dia. Queixo-me que trabalho muito, ganho pouco e ninguém me reconhece como mereço. Sou uma mártire. Uma mártire dos queixumes.
E depois aparece-me uma cliente, daquelas desde sempre, desde que eu ainda nem eatava na loja. Uma cliente cujo neto, miúdo pequeno está a batalhar contra um cancro. Uma cliente cuja mãe, que a acompanhava muitas vezes às compras, mesmo já estando perto dos 90, caiu e partiu a anca e não consegue andar. Uma cliente cuja vivacidade se perdeu em menos de um ano. Ficou com o cabelo todo branco. Está tão magra que a pele está quase transparente. Uma cliente que à minha frente estava a ter tonturas, com vontade de chorar mas mesmo assim fazia uma força hercúlea para sorrir e disse-me com toda a força do Mundo "Eu tenho que acreditar, eu QUERO acreditar, EU VOU CONSEGUIR".
E eu sinto-me uma merda. Uma mártire queixosa da feira. Porque não tenho nada de que me queixar. É verdade que ando cansada. É verdade que onde tinha olhos, agora tenho dois buracos negros. Mas nada mais. Não tenho problemas a sério. Tenho os meus problemas, as minhas dores, as minhas preocupações, mas há quem, infelizmente, esteja bem pior.